terça-feira, 29 de janeiro de 2019

JOAQUIM LOURENÇO: ESPALHA OS POETAS.

Joaquim Lourenço nasceu na vila da Chamusca - distrito de Santarém. Aprendeu desde criança quase todos os géneros musicais como instrumentista e nas peças de teatro escolar. Na Universidade de Coimbra estudou Sociologia e Psicologia. Mas a alma da música pegou-lhe na mão. Já dono da sua identidade decide cantar. Primeiro, o American Songbook - influenciado por Sinatra, Tony Bennett, Nat King Cole; depois, os clássicos da Música Portuguesa - como Simone de Oliveira, Paulo de Carvalho, Fernando Tordo, Carlos Mendes, Carlos do Carmo e outros. Em 2003 começou a bem sucedida aventura do Teatro Musical da Broadway e da Off-Broadway Nova Iorquina. Em 2009 estreia a Digressão Ary, O Poeta das Canções que ainda se mantem nas salas nacionais. Produz espectáculos e artistas nacionais internacionalmente. É autor de vários estudos sobre gestão cultural e internacionalização da arte e cultura portuguesas. Aqui ficam as respostas de Joaquim Lourenço.

1ª Assumes-te como autor, performer e produtor independente. Como consegues assumir tanta responsabilidade? Ou é uma forma de sobrevivência?
Faço-o por gosto e por sobrevivência. Por gosto de cada uma das actividades e para viver do que faço. Daqui a uma semana fará 10 anos que estreamos o Espectáculo Ary, O Poeta das Canções e isso só acontecerá, talvez, porque sou ao mesmo tempo cantor, arranjador, produtor, manager, assessor de imprensa, promotor e vendedor deste espectáculo. Só no ano passado contratei uma assistente de produção porque era necessário vender os discos nos espectáculos e estando a recuperar de uma ruptura total do tendão de Aquiles da perna direita (em consequência de uma queda de um palco, no Teatro do Cadaval) aconselharam-me a não conduzir muitas horas seguidas e a não fazer grandes esforços físicos. Reduzir ao mínimo os custos de produção foi uma das principais razões da sobrevivência e da longevidade desta Digressão Nacional.

2ª Os empresários do espetáculo praticamente desapareceram. As redes parecem estar viciadas. Como é possível programar as itinerâncias com tantos custos associados e poucos patrocinadores?
Fazendo uma só pessoa quase tudo. Acumulando funções. Vivendo com muito pouco dinheiro e sendo muito criterioso no investimento financeiro. Este Espectáculo tem hoje: um pianista, um contrabaixista, um baterista, um violinista, um saxofonista, um acordeonista, um guitarrista, uma bailarina, um cantor, um técnico de som, um técnico de luz, um técnico de vídeo, um designer e agora uma assistente de produção: 14 pessoas. Pago a todos estes intervenientes e ainda direitos de autor à Sociedade Portuguesa de Autores, licença à IGAC, refeições, despesas de deslocação, alojamento e muitas vezes a comunicação do espectáculo. Sempre que possível ainda doo pelo menos 1€ de cada bilhete vendido a uma instituição de trabalho relevante para a comunidade. A APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) é a instituição que mais vezes ajudamos. Quando uma Câmara Municipal compra este Espectáculo durmo as 7 horas de sono ‘de um justo’. Quando tenho de ‘ir à bilheteira’ não durmo quase nada e algumas vezes regresso a casa sem um tostão na algibeira. Tive de aprender a distribuir cartazes e flyers, a fazer marketing digital, a fazer parcerias com instituições locais e com a comunicação social e a gerir cada cêntimo gasto. Nunca tive um subsídio estatal ou de um organismo público. Consegui 2 vezes um patrocinador local para viabilizar o espectáculo em 2 cidades distintas. Um era meu amigo (uma empresa privada de Coimbra). O outro comprou 100 bilhetes para oferecer aos seus clientes (a Caixa de Crédito Agrícola do Cartaxo). Quem programa os auditórios ou os cine-teatros municipais é por norma alguém que escolhe e compra apenas performances denominadas de vanguarda. Quando lêem o nome Ary dos Santos ou ignoram quem foi ou acham que se trata de canções festivaleiras. Nos concelhos onde não há auditórios ou Cine-teatros e só espectáculos ao ar livre (certames de actividades económicas, festas populares, festas da Cidade, etc.) os Vereadores da Cultura acham que o espectáculo não é apropriado. Ou seja, ‘somos presos por ter cão e presos por não ter’. Resta-me, muitas vezes, pedir a cedência do Cine-teatro local para ‘ir à bilheteira’. Mas há muitos espaços que mesmo assim recusam a cedência (porque acham que não nos enquadramos na tal linha programática) ou pedem valores de aluguer inflacionados (por certo para inviabilizarem a realização). Posso enumerar vários de norte a sul. Parece não haver democracia cultural numa boa parte deste país. Tem sido um ‘caminho de pedras’, de insistência, de risco permanente mas de contínuo aguçar de engenho, de criatividade prática e invenção de soluções. É, mais que isso, é a paixão e o amor à Obra do Ary que ainda me faz aqui estar. 


3ª Ary dos Santos é o teu novo desafio. Achas que o Ary dos Santos mudou o Joaquim Lourenço?
O Ary é um caso raro. Talvez único. Um Poeta que decidiu escrever para a música ligeira para que os seus textos fossem conhecidos por toda a gente e não esquecidos no pó da prateleira lá de casa ou das bibliotecas. E, de facto, um país com quase metade da população analfabeta cantou de cor versos de fino recorte literário. Gente que nunca tinha aberto um livro de poesia (ou qualquer outro) ‘cantou na banheira’ poesia pura! O mais irónico e inquietante de tudo é que 50 anos depois, hoje, quando um país inteiro já sabe ler, o que se ‘canta no banho’ são letras minimais e que de poéticas não parecem ter nada… Para responder objectivamente à tua pergunta acho que o Ary mostrou-me o que eu quero fazer quando esta Digressão terminar: cantar ou teatralizar mais Poetas portugueses. Mesmo que o público pareça desinteressado ou os decisores menosprezem a defesa da língua que ainda falam.

4ª Há muitos poetas que estão esquecidos embora sejam imprescindíveis. Que outro poeta gostarias de levar ao palco?
Quase todos. A tua Natália, o Eugénio de Andrade, o Mário de Cesariny, a Sophia, o Ruy Belo, o Mário de Sá Carneiro (que parece tão fácil a sua dramatização), o José Régio. Isto só para falar dos do século XX. Depois há muito que gostava de juntar o Camões e o Pessoa no mesmo Espectáculo sob a temática da épica portuguesa. Até os Poetas de Coimbra se podem juntar num espectáculo, António. O Camilo Pessanha, o António Nobre, o Torga, o Manuel Alegre… Quero ainda musicar alguns poemas do nosso imaginário colectivo, sendo mais fácil fazê-lo aos formalmente mais rígidos, como os sonetos. Ao mesmo tempo tenho recebido alguns convites para dar voz a alguns textos poéticos especialmente durante lançamentos de livros. Aconteceu isso há algum tempo, na Casa do Alentejo em Lisboa, com a obra de um escritor premiado. O meu pianista acompanhou-me em 6 poemas ditos, musicamos e cantei outros 2 e o resultado foi muito aplaudido. Faço-o enquanto actor mais do que enquanto diseur, inspirado que sou no Mário Viegas. Não sei se imediatamente a seguir à Digressão do Ary, mas juntarei no mesmo espectáculo os grandes Poetas portugueses, do Camões aos contemporâneos, dramatizando/representando os seus poemas mais representativos com actores/bailarinos e com músicos que tocarão uma banda sonora em tempo real ao mesmo tempo que imagens videográficas interagirão com a performance. O desafio é encontrar nos poemas um fio condutor que sirva uma história, uma narrativa e que facilite uma dramaturgia. Provisoriamente dou o nome de Poetas do Meu País a este Espectáculo.
5ª O que te falta fazer?
Para já conseguir levar o Ary aos sítios onde ainda não consegui ir. E internacionaliza-lo. Falta-me fazer uma itinerância pelos Mosteiros, Conventos e Castelos de Portugal cantando versões contemporâneas dos clássicos da música portuguesa. Quero muito com isto juntar património imaterial (neste caso as canções históricas da música portuguesa) ao património material (monumentos e edifícios de interesse histórico e público). Tenho ainda de conseguir despertar nas gerações mais novas o interesse e o amor pelo legado cultural português. O amor ao que de melhor se escreveu e compôs antes de nós. Para além disso falta-me fazer tudo.


Entrevista: António Vilhena e Angel Machado.

domingo, 27 de janeiro de 2019

Manifesto da contemplação.

Por que demoram tanto a dizer a verdade, a serem transparentes, a conjugarem as palavras com a vida, a reconhecerem que há má vontade e que há outras agendas que ocultam prioridades que não contemplam as pessoas?

Por que razão a hipocrisia é tão sinistra quando se trata de olhar os olhos dos que sofrem e precisam?

Por que fingem não ouvir os gritos que atravessam as paredes e estilhaçam os vidros duplos das janelas?

Por que são feitos de verniz os lábios que ofendem e insultam a dignidade, silenciando-se perante os apelos que atravessam as noites frias?

Por que falam sempre dos pobres os que regressam dos festins, bêbados e pançudos, e, às vezes, até falam de Deus, como se precisassem de certas palavras para adormecerem?

Por que acordam cedo os que dormem na rua e os senhores de poderes alados falam no altar da neve onde o verão parece ter nascido?

Por que precisam de renascer tantas vezes os que precisam de viver os anos que os tubarões vivem a dobrar?

Por que é preciso ser tolerante com quem é míope quando a miséria dorme à sua porta?

Por que nascem fardas e balas onde havia flores e escolas, onde havia cotovias e melros nos caminhos de terra fértil?

Por que fazem acreditar que a crosta terrestre tem dono, herdeiros e feitores das pedras?

Por que somam os dias para acrescentarem as estrelas ao seu património e asfixiarem o ar e as pastagens?

Ah! E as rosas que hão-de perfumar os corpos funestos como há milhares de anos. Ide ler a Ilíada de Homero, esse poema que inspirou Alexandre, e que lia todas as noites antes de adormecer. Ide estudar os heróis de Troia – os gregos e os troianos -, para aprenderem que a dor é universal e proporcional à soma da dor da alma e da carne.


António Vilhena

sábado, 26 de janeiro de 2019

UMA FOTO - SAULO JOSÉ.

"O azul é a cor mais quente. É o deleite de uma natureza generosa,
com traços que enfeitam a paisagem e a vida humana." Saulo José.







@saulojoseweb
Blogue

quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Dia de Portugal: o trágico e o preconceito.

                                                                                                                                                               Foto: Vitor Oliveira
A polémica com a escolha de João Miguel Tavares para presidir às comemorações do 10 de Junho, Dia de Portugal, natural de Portalegre, parece-me excessiva. Eu sei que somos o que escrevemos e o que pensamentos. Às vezes, irrita-me lê-lo, mas não me choca que o JMT seja o escolhido. Chocam-me alguns argumentos, que tenho lido, de algumas pessoas que considero. Não o conheço pessoalmente, nunca falámos. Temos em comum sermos do Alentejo e gostarmos muito daquela região.

As opiniões mais pertinentes surgiram, exatamente, de alguma comunicação social, onde o JMT ganha a vida. A minha amiga jornalista Leonete Botelho foi escolhida esta semana para presidir à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista e a opinião foi quase unânime. Não é por JMT ser jornalista que é criticado, é pelo seu posicionamento político – nos antípodas de mim. Aqueles que o criticam por aparecer em certos programas de humor, parece que o humor ainda é um preconceito, esquecessem-se que Pedro Mexia também foi escolhido para assessor, por Marcelo Rebelo de Sousa, e não vi animosidade. Se a escolha tivesse recaído em Ricardo Araújo será que havia tanto barulho?

O 10 de Junho, Dia de Portugal, é de todos os portugueses, é o dia da morte de Camões em 1580, o dia da Língua Portuguesa, e o facto de ser um jornalista a presidir, que pensa e escreve diferente de mim, mas é um democrata, não me repugna. Creio que Portalegre ficou orgulhosa com a escolha de um filho da terra. E talvez ouçamos o poema “Balada de Portalegre” de José Régio: (…) E era então que sucedia // Que em Portalegre, cidade // Do Alto Alentejo, cercada // De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros // Aos pés lá da casa velha // Cheia dos maus e bons cheiros // Das casa que têm história, // Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória // De antigas gentes e traças, // Cheia de sol nas vidraças // E de escuro nos recantos, // Cheia de medo e sossego, // De silêncios e de espantos, // - A minha acácia crescia.
António Vilhena

Misérias de caráter.


Goya, "Os fuzilamentos de 3 de Maio de 1808".
“Não peças a quem pediu, nem sirvas a quem serviu”- diz o povo. Não há nada mais miserável do que alguém ostentar as suas próprias misérias de carácter quando exerce o “músculo”. Natália Correia gostava de virar o esqueleto dos que lhe acenavam com perfumes baratos e má poesia, usava o chicote da indiferença e subia ao escárnio para ver “os subalimentados do sonho”.

Todos nós conhecemos histórias tristes, de gente triste que entristece, porque não sabe, não pode e não tem competências para gerar consensos – é a amargura num cálice de medo. Soube recentemente que um amigo foi impedido de ir às aulas de doutoramento por quem manda, apesar de ser cumpridor, trabalhar, trabalhar, trabalhar…. Ter-lhe-ão dito: “ou estuda ou trabalha”.

Não quero trazer aqui o que diz o espírito da lei e a interpretação da mesma. O que me interessa é exaltar esse amigo, homem de bons costumes, educado e de trato irrepreensível, que ousa saber mais para devolver ao bem comum o conhecimento. Este caso lembra-me o Princípio de Peter (supercompetente, competente, incompetente). O meu amigo costuma dizer, com algum humor, que ainda há-de ver um sapo cantar, tantas serão as pedras que “essa pessoa” ainda vai encontrar ao longo da vida.

O sacrifico por boas causas enobrece o Homem; a tolerância traz o conhecimento e a pluralidade; a ignorância traz o medo e a violência. Os arriscados e disfóricos investimentos nas relações humanas tem normalmente juros muito elevados: acabam a falar sozinhos e despendem-se com uma chuva de ódios. Nada é eterno e, pior do que isso, uma pessoa triste, assim, não pode ser outra coisa, senão, um cálice de amargura.


António Vilhena

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

OS BEIJA-MÃOS.



Há gente que se presta a cada papel que tenho dificuldade em classificá-la. Há um mínimo de decência e de cordialidade que não se deve confundir com subserviência ou qualquer coisa ainda pior. Todos conhecemos pessoas que se ajeitam para perpetuarem os seus sapatos debaixo da cadeira. É aquele tipo de pessoa que diz "sim" a tudo ao chefe, mas depois, nas suas costas, expressa solidariedade aos colegas. 

Quando mudam as administrações algumas destas personagens começam meses antes a afastarem-se dos que ainda estão no poder e que lhes deram a mão. Fazem isso por calculismo, porque querem dar a entender à próxima administração que nada tiveram com o passado e, portanto, podem contar com eles no futuro. Alguns conseguem, são mercenários sem escrúpulos e sem coluna.

Na política é a mesma coisa. Infelizmente esses "travestis" perigosos, oportunistas de carreira, bombistas de mau cheiro envenenam o ambiente. São perigosos alcoviteiros e capitães da intriga e do faz de conta entre colegas, pequenos ditadores com poucas competências. Mas eles existem e às vezes levam anos a serem conhecidos e corridos. Eu conheço alguns que são exímios manipuladores e falsos como as cobras.


António Vilhena

CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS: CRIME SILENCIOSO.


Quando nos lembramos das famílias que durante a crise perderam as casas porque não conseguiam pagar as mensalidades; quando nos lembramos das famílias que viram os seus bens penhorados por não conseguirem pagar aos bancos – alguns apenas alguns euros; quando nos lembramos do banqueiro que disse para aguentarmos; quando nos lembramos dos despejos e os agentes judiciais a entrarem nas casas com um séquito de polícias para garantirem que se cumpria a lei, ficamos revoltados e não há bom senso que nos faça calar perante o conhecimento da lista de devedores à Caixa Geral de Depósitos.

Eu sei que as grandes empresas só movimentam milhões, mas também sei que quando se pede tostões a um banco eles só emprestam com garantias que ultrapassam em muito o que se lhe pede. No caso da Caixa são muitos milhões que não precisaram de garantias. E onde fica a responsabilidade do Banco de Portugal? Há uma cumplicidade sistémica onde o silêncio de uns alimenta o silêncio de outros.

O que incomoda é que sejam sempre os mesmos a calarem-se, e a serem tolerante; que haja uma cultura de impunidade que permeia os incumpridores crónicos. Fazem-nos acreditar que são geniais, bons gestores, defensores da coisa pública e merecedores de recompensas. Este é o exemplo que deve indignar os que não temem dizer as verdades.

Se há Justiça em Portugal, se somos uma República, se queremos combater a irresponsabilidade e o crime organizado tem que haver responsabilidade. Agora percebemos melhor por que razão Portugal bateu no fundo e todos pagamos para alimentar estes parasitas crónicos. 


António Vilhena

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Beja: vergonha de comboios.


Os que mandam neste país não andam de comboio, e quando vão ao Alentejo levam carro. Mas, infelizmente, ainda há quem precise de usar o comboio. Diga-se que é uma opção inteligente. Quem vai para Beja não sabe se chega e quando chega. Ao longo do tempo o serviço degradou-se tanto que o melhor é não ter expectativas. Os sucessivos governantes têm relegado o Baixo Alentejo para uma periferia degradante.

Quem governa as autarquias, e muitas são governadas por socialistas, têm um certo pudor em confrontar o governo – percebe-se mas não se justifica. O governo anuncia um novo aeroporto nas barbas do Lisboa e com vista para o de Beja; anuncia o maior terminal de comboios para o norte; anuncia a ampliação do Metro de Lisboa; anuncia, anuncia, mas o Alentejo espera e desespera.

Apetece perguntar se a cumplicidade silenciosa dos autarcas do Baixo Alentejo justifica tanta parcimónia com quem não retribui. Os alentejanos são um povo ordeiro, mas, quem conhece a sua história, sabe, também, que o balão não enche eternamente. 

É tempo da diáspora alentejana erguer a voz contra a cidadania de segunda a que os sucessivos governos condenaram os que vivem para além do Tejo.

António Vilhena

sábado, 19 de janeiro de 2019

UMA FOTO - JOSÉ VIEIRA.

                       "Verão. E a brisa segredava beijos aos que eram apanhados na distração morna do sol. 
                        Em comunhão: o tempo, a paixão e o acaso do meu olhar criaram o momento decisivo, 
                        a metáfora de um dia ganho." José Vieira




@josevieirapt

quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

OS INGLESES TÊM DOIS AMORES.

                                                                                                                                                                        Getty Images
Todos sabemos que alguns ingleses preferem ficar na ilha, orgulhosamente ilhéus com a sua a Coroa a negociar chá e vinho dos outros. A Inglaterra não entrou com entusiasmo na União Europeia, adotou a máxima: vamos para a União e quando quisermos damos cabo deles. Os verdadeiros europeístas não estão em Inglaterra, a prova disso é que nunca adotaram o Euro.

O aumento de eurocéticos facilitou os discursos mais populistas com alguma responsabilidade dos Trabalhistas durante a campanha do referendo. Aqueles que defenderam o BREXIT saíram de cena e Theresa May cozinhou um acordo que os deputados rejeitaram com uma diferença de 230 votos – uma derrota humilhante para a senhora May. Apesar de ter resistido à moção de desconfiança, há imensas incógnitas. O mais provável é que haja uma clarificação eleitoral: ouvir a voz do povo.

Há sinais de que um segundo referendo seria a solução. A construção de uma Europa Política e Monetária será sempre mais forte com o Reino Unido. Os ingleses não querem deixar a ilha nem os privilégios da União Europeia. É caso para dizer que têm dois amores. Mas o melhor dos dois mundos é quase sempre impossível de conciliar. Aos ingleses o que é da ilha, à Europa o que é dos gregos e latinos.


António Vilhena

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

ANDRÉ SARDET LANÇA NOVO ÁLBUM EM 2019.

André Sardet é um nome maior da música portuguesa. Com 23 anos de carreira e seis álbuns editados - IMAGENS (1996), AGIRA ANTES DE USAR (1998), ANDRÉ SARDET (2002), ACÚSTICO (2006), MUNDO DE CARTÃO (2008), PÁRA, ESCUTA E OLHA (2008) -, prepara um novo álbum em 2019. Autor de vários êxitos, "Adivinha O Quanto Gosto De Ti", "Foi Feitiço", "Quando Te Falei Em Amor", "O Azul do Céu", o músico, que alcançou com ACÚSTICO o primeiro lugar do top de vendas nacional, onde permaneceu 55 semanas, 12 das quais em primeiro lugar, continua a surpreender-nos. Em 2014 canta em dueto com Mayra Andrade a música “A Seta” que se tornou o tema principal da banda sonora do filme de Joaquim Leitão “Sei Lá”. Quisemos saber um pouco mais do homem e do músico. Aqui ficam as respostas de André Sardet.

1ª A paixão pela música revelou-se cedo. Como surgiu essa aventura?
Esta aventura começou como começam todos os sonhos... o sonho foi surgindo, foi-me levando e deixei-me sonhar. Depois, mais tarde percebi que a música tinha e tem uma importância na definição da minha personalidade e no meu equilíbrio emocional. Hoje tenho uma noção mais real da importância da música na minha vida, mas no inicio era algo naif, algo inquantificável...

2ª O teu pai foi um grande entusiasta dos teus projetos musicais. Que importância teve na tua carreira como músico?
Teve um papel muito importante na medida em que me deixou viver uma vida que aos olhos de outros é vista como um enorme risco, uma coisa sem futuro. Os meus pais sempre me disseram para ir em frente, mas para não me esquecer que se era para ser músico tinha que dar o meu máximo e o meu melhor. Tive a enorme felicidade de ser amplamente reconhecido antes dele partir...

3ª O Alentejo é uma referência no teu imaginário. Porquê?
Os meus avós, o meu pai deram-me a conhecer o Alentejo, a sua luz, os seus sabores, os seus cheiros. Gosto muito do Alentejo, era capaz de lá viver...

4ª És autor, compositor e cantor. Podes contar-nos como funciona esse processo criativo. O que te dá mais satisfação?
A interpretação e a composição são prazeres diferentes. Há uma primeira fase, a composição, em que me entrego sem saber o que vai sair, o que vou contar... componho e escrevo ao mesmo tempo, o que me “obriga” a procurar inspiração em dose dupla. Acho que desta forma a música e a letra se envolvem de uma forma mais feliz, mais natural e mais coerente. Depois a interpretação, tem como principal missão transmitir os sentimentos que estão nas entrelinhas das letras que escrevo. A interpretação pode ser melhorada, renovada, as letras e as músicas não. É a procura de uma interpretação melhor que faz com que uma música nunca morra.

5ª Já conhecemos a canção “Ponto de partida” do novo álbum. O que podemos saber mais?
Podemos esperar um novo álbum em 2019. Tenho alguns temas gravados e todos compostos. Estava com muitas saudades e muitas histórias para contar.

Entrevista: António Vilhena e Angel Machado.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Amor com amor se paga.

                                                                                                                                                       Foto: Estela Silva / Lusa

A última disputa entre Rui Rio e Montenegro serviu para algumas reflexões. Em casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão. Mas em política o pão tem outros sinónimos e faz alguns protagonistas sentirem-se reis do mundo, pelo menos do mundo que julgam que representam.

Rui Rio nunca foi um homem do aparelho, veio do norte e isso faz toda a diferença para os que julgam que o Terreiro do Paço é, ainda, a Praça do Império. Já aconteceu com muitos que foram das Beiras, de Trás-os-Montes ou do Alentejo. A capitalite, uma doença antiga, ainda não erradicada, continua a fazer vítimas.

Mas o pior nestas circunstâncias é a argumentação usada pró e contra. Do lado da cidadania, escuto o argumentário de ambas as partes. As palavras são duras e procuram um KO fulminante para que o adversário vá ao tapete. Quem tem mais a perder tem mais responsabilidade e cada palavra é ampliada na “máquina da verdade”. Em política vale quase tudo, mas parece-me que usar o argumento de “maçon”, imaturo e irresponsável para atacar Montenegro era desnecessário. 

António Vilhena

sábado, 12 de janeiro de 2019

De que falamos quando falamos de cultura?




Raymont Carvet (1938-1988), escritor norte-americano, escreveu De Que Falamos Quando Falamos de Amor; foi um mestre do novo conto americano, que se inspirou em locais sofridos que destruíram sonhos.

Há coisas que estão a mudar: o governo anunciou um novo aeroporto e um grande incremento no Metro de Lisboa. Ficámos todos a saber que a capital do império continua a ser Lisboa. Nunca me oponho ao desenvolvimento, acho mesmo que os turistas têm que justificar a taxa que pagam.

Os ministros da cultura entram e saem entre as sombras, são uma reminiscência do Mito da Caverna. Arrisco-me a dizer que Portugal só teve dois Ministros da Cultura: Lucas Pires e Manuel Maria Carrilho.

O Ministério da Cultura exige tarimba humanista e conhecimento de hermenêutica, visão e sensibilidade.

De que falamos quando falamos de cultura em Portugal? Infelizmente, falamos de gente que vive assombrada com as estatísticas, com a mediatização das migalhas que atribui aos agentes culturais, de protagonistas provincianos que gostariam de pegar na mão dos programadores, de escolher os elencos e de encomendar a crítica. O pior de tudo não são os que têm temporariamente poder, mas o que imaginam que a Cultura é um álbum para guardar velhas fotografias.

Há aqui, também, imensos lugares sofridos que ganhariam a ironia e o trágico de Raymond Carvet.


António Vilhena

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Universidade de Coimbra: o próximo Reitor será português.



A Universidade de Coimbra vai a votos em Fevereiro para escolher o seu Reitor. Aparentemente trata-se de um processo normal em democracia. Recentemente o Reitor João Gabriel referia que a Universidade de Coimbra devia seguir o caminho da internacionalização. Esta afirmação tem várias perspetivas: o Reitor referia-se, com toda a certeza, a atrair mais alunos como forma de aumentar as receitas próprias - não estaria a pensar deixar a sua cadeira reitoral a um colega brasileiro, chinês ou americano; o Reitor estaria a pensar investir mais na divulgação da velha universidade no mundo – não estaria a pensar apoucá-la.

Mas existe alguma universidade portuguesa que seja mais conhecida internacionalmente do que a de Coimbra? Há mais de setecentos anos que é conhecida no mundo, foi a primeira caravela que deu início à globalização.

Apresentaram-se, até agora, cinco candidatos a reitores, entre eles um do Brasil e outro de Singapura. A visibilidade da Universidade de Coimbra, também, se vê por esta apetência. Mas saberão os Professores Duília Fernandes de Mello e Yang Chen como funciona a eleição? Não me refiro ao ato em si, depositar o voto na urna, mas o que é preciso fazer para garantir o voto. Há uma longa noite que antecede esses atos eleitorais.

A minha homenagem a esses candidatos estrangeiros que se oferecem para dignificar a vitória de um dos Professores Amílcar Falcão, Ernesto Costa ou José Pedro Paiva que irá ser escolhido pelos 35 membros do Conselho Geral da Universidade de Coimbra. Acresce que a Universidade de Coimbra ainda não elegeu uma Reitora, o que não deixa de ser uma constatação com forte leitura política. Há instituições que semeiam velhas cepas, mas gostam de falar de vinho novo.


António Vilhena

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Correios, mas pouco.



Pode uma carta de correio azul demorar mais de dez dias a chegar de Coimbra a Coimbra? Pode. Isso aconteceu comigo. E qual a reflexão? É que os Correios estão a funcionar mal, digo mesmo, muito mal. Desde que privatizaram os Correios ao preço da uva mijona, o descalabro é exponencial. Os novos donos dos Correios ávidos do lucro, fecharam balcões, despediram, desqualificaram, desinvestiram no serviço postal.

Um balcão de correios vende tudo, é uma espécie de loja de chinês. E se tivermos sorte, o funcionário ainda nos pergunta se queremos comprar a lotaria. É uma verdadeira feira da ladra, onde há de tudo para o “menino e para a menina”.

O serviço postal é fundamental para a economia do país. Cada vez que uma carta se atrasa, há, possivelmente, alguma instituição pública ou privada, cidadão ou empresa que fica à espera; há documentos que não chegam e prazos que não se cumprem. Esta gente que comprou parte do país a retalho vive na impunidade e a entidade reguladora assobia para as Berlengas.

É preciso dizer que os Correios prestam um péssimo serviço postal, que desonra a sua história e não merece, neste momento, qualquer contemplação.

Haja decoro.


António Vilhena

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

A misoginia seletiva do escritor Yann Moix.


Adoro mulheres de todas as idades, há nelas a mão divina que acertou o traço pelos olhos do poeta, deu-lhes a geometria do corpo e da alma, fez delas a música que embala o desejo e cultiva a paixão.

Vem isto a propósito do escritor francês Yann Moix (50 anos) que declarou, à revista Marie Claire, que as mulheres, depois dos cinquenta anos, são velhas para serem amadas. Este escritor francês, premiado, traduzido, com uma história de vida nada fácil – como ele refere -, assume que “não precisa de responder ao tribunal do gosto”.

Podia discorrer sobre alguns traços de personalidade, mas não seria justo nem intelectualmente honesto. O homem que, também é escritor, tem toda a legitimidade de ir para a cama com quem quiser. Cada um vê nos seus fantasmas a misoginia seletiva que explica muitas das suas opções. Um escritor tem, também, uma responsabilidade social que não deve esquecer em qualquer circunstância. E Yann Moix esqueceu essa responsabilidade. A sua infeliz afirmação tornou-o, infelizmente, mais conhecido do que desejaria.

Mas ficamos a saber pelo próprio Yann Moix, a propósito do seu livro Naissance (2013),  que "A vida de Yann Moix contada por Yann Moix é insuportável de se ler. Uma escrita ilegível que conta uma vida inabitável, isso é demais para mim. A vida é curta demais para ler a longa vida de alguém como Moix."


António Vilhena

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Marcelo sabe ser grato.


Eu não sei se o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa telefonou espontaneamente a uma apresentadora de televisão – ele é surpreendente e surpreende-se a si próprio. Mas tendo em conta as boas relações com o dono da estação, Dr. Pinto Balsemão, possivelmente terá havido uma conversa de orelha. Não se esqueçam que o Professor Marcelo é um guru das televisões, mas, também, trabalhou no Expresso, sabe ser grato e não deixa que lhe deem lições.

Prevejo que o Presidente o fará mais vezes para outros canais e protagonistas, ele sabe o que se escreveu nas redes sociais e não deixará de dar a resposta no momento mais adequado. 

Se o Presidente tivesse telefonado para um canal público teria tantas críticas? Provavelmente o Presidente não precisaria de o ter feito, bastaria uma mensagem de felicitações, mas Marcelo Rebelo de Sousa gosta de ser a notícia da notícia. O que pode mais pode menos e eu prefiro um Presidente assim, com alguns excessos, do que um cavaquista sorumbático e a comer com a boca cheia para não falar aos jornalistas.


António Vilhena

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Portugal para os que dão o litro.


Somos porreiros, somos excecionais, somos campeões, somos tolerantes e acolhedores; somos parcimoniosos com fascistas, promovemos os que mataram, os que transpiram ódio e defendem o regresso ao passado. Somos um país de brandos costumes, com uma alma que chega para quase todos. Às vezes, não chega para os que dão o litro, para os que se esforçam e envelhecem à espera que a esperança traga alguma novidade.

Temos o melhor Ministro das Finanças da Europa – que coisa maravilhosa! -, numa altura em que os populismos saem à rua e se formam novos partidos acenando aos saudosistas. Temos alguma imprensa que confunde liberdade com audiências. Temos tanta gente a precisar de estudar, urgentemente, História – diria que basta o século vinte onde encontra muita matéria que justifica o esforço.

Vivemos tempos de retrocesso civilizacional, onde os Trumps, os Bolsonaros e outros escalam a Democracia para ascenderem ao poder. Há muita responsabilidade na esquerda que foi capturada pelo grande capital, que se deixou engravatar para participar nas cimeiras dos senhores do mundo. A resposta é uma luta sem tréguas aos que põem em causa as conquistas da civilização, os direitos e o desenvolvimento e, principalmente, os valores do humanismo.

Se não o fizermos, estamos a ser cúmplices e não estamos à altura das responsabilidades dos que deram a vida por tudo o que somos e conquistámos.


António Vilhena


sábado, 5 de janeiro de 2019

NEM AZUL, NEM ROSA!



Qual é a cor da liberdade? – perguntava Jorge de Sena. Talvez a pergunta do poeta de 40 Anos de Servidão ainda faça sentido, quando em pleno século XXI uma ministra ousa ignorar que uma mulher veste a cor que quer e um homem também. Eu dispo-me de preconceitos e protesto contra a segregação do Pantone.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

NÃO NOS ILUDAMOS.


Quando mudar a página do calendário para 2019, quase nada terá mudado no mundo: a América terá Trump, o Brasil receberá Bolsonaro, a Síria alimenta Assad, a Venezuela morre com Maduro e alguns países de África banalizam a morte como gostas de chuva. Dirão que ainda faltam aqui muitos na lista – estou de acordo.

Mas estes exemplos servem para não nos iludirmos com a chegada do novo ano. Há mudanças possíveis, e essas são as que cada um pode fazer na sua vida, nas relações com aqueles que nos estimam e amam, com os que nos motivam a crescer e a cultivarmos a bondade. Esta mensagem é, principalmente, para os que sabem que são incondicionalmente solidários e fraternos. Apesar de a esperança ser o alimento da mudança, cultivo a utopia que nos agiganta a subir as montanhas. 


VOTOS de BOM ANO 2019.


António Vilhena